quarta-feira, 31 de março de 2010

Traços e cores

A lua cheia brinca num espelho de neve.
Vagarosa, a noite vai,fecha janelas,
ouve o movimento das ondas do mar.

Um menino pisca os olhos,
afaga os moluscos colados às pedras.

Segredos paralisam as palavras,
desejos quebram-se,
fragmentados, revelam-se.

Há uma paixão oculta no olhar.

Seguimos caminhos traçados
em cores e traços
e nas fotografias das manhãs.

Vejo tua face de anjo
no reflexo das águas.

Eu amo.
A noite segue a claridade dos teus olhos.
Toda minha alma guarda a tua alegria.

As horas trabalham silêncios.
Lá no fundo do quarto,
mãos secam as pálpebras molhadas.

Eu choro a transitoriedade do tempo.

Um menino

Ainda sou um menino.
Ás águas dos rios,
trazem às lembranças,
barcos de papel.

No colo de mamãe,
choro a falta de brinquedos
e ausência dos primeiros amores:
A menina calada no fundo da sala
e o menino malvado
que afogou os passarinhos.

A poeira das estradas
esconde carros de lata.
ainda faltam moedas
para ver os filmes de farwest.

Trêmulo,
escondo-me debaixo das árvores,
tibungo nos açudes.
Sou um menino
quando apagam a fogueira de São João
e a fumaça leva poemas às nuvens.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Fragmentos

Mistérios ligam desejos
no silêncio das cores.

Palavras movimentam estrelas.


A coragem afasta as dúvidas
e as pedras no caminho,

onde brilham nos lábios
as marcas de amores em fuga.


Meus poemas são asas.
Levam-me para um mundos distante
e a liberdade é o canto final
de todos os seres.

domingo, 28 de março de 2010

Há canções compostas
para suportarmos
o medo e a dor.

Há o desejo de permanecer
com os olhos bem abertos,
para enfrentar a saudade
e o esquecimento.

Há um vago gesto em círculo
a traçar os rumos do tempo.

Recolhidos,sentimos na pele
a mudança dos ventos.

Há poesia no movimento dos automóveis.

Buzinam,levantam a poeira,
adubam as rosas no asfalto.

Há uma lágrima na saia da moça.
Aérea, espera o amor.
Sem flores, carrega no olhar
as águas dos rios límpidos.

As manhãs são as mesmas.

Só os homens fabricam pensamentos,
esquecem as horas e o milagre
da multiplicação dos peixes.

segunda-feira, 22 de março de 2010

O amor tudo muda

Quando chega o amor
demônios adormecem e sonham.
Guardam na ponta dos dedos
a luz dos astros
e a alma das flores.

Nas linhas dos mapas
e nas rodas do mundo
a solidão se transporta
no movimento das cores.

Flocos de nuvens
transformam-se em ovelhas.

O amor tudo muda.

Li centenas de vezes
nos livros sagrados
e na plácidez do olhar
dos homens em comunhão.

domingo, 21 de março de 2010

Eu

Eu sou a folia das manhãs

confetes colados no corpo,

batucadas na alma.

Eu sou os braços

abertos dos passistas

numa quarta-feira feliz.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Temporais

Num sonho,vagavas:
Véus cobriam teu corpo

corrias sem medo,
no ritmo dos temporais.

Ventos gelados sopravam poemas,
palavras borbulhavam nos olhos.

Dançavas alegre,
os rituais da despedida.

Meus gritos ainda ferem a noite.


Nessa contradança,
mergulho silêncios.

Esqueço que falas meu nome
contra as pedras
e atiras as lembranças
na fúria das águas.

domingo, 14 de março de 2010

O meu amar

O meu amar equilibra-se
entre o sim e o não.

Desnudo
aparece nas imagens
editadas no ano 2100
e endoidece
Jung e Lacan.

De bom humor,
estala os dedos,
pisca os olhos,
escreve recados,
num dia sem sal.

Desliza nas ondas,
nas linhas e nas ruas,
onde pintam de azuis
as janelas do trem.

Segue caminhos.
Leva nas mãos um leque de plumas
e se refresca no corpo de Zeus.

O meu amar revela-se nas trilhas
do verde,
desmolha-se nas paisagens.

Insano,
assanha os cabelos de Fedra,
foge da fúria e do fogo,
se entrega aos olhares
de Medusa e Prometeu.

O espelho das águas

O espelho das águas
revela o manto
das almas
habitadas
em mim.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Uma carta para Heloisa Galvez

Heloisa.
Quando encontrares Drummond,
Torquato, Orides e Quintana,
Peça o guia dos poetas
que foram coxos na vida.

Teus olhos veem longe.
Podem ver a cor das almas
que amam demais.

Naves de luz
transportam e guardam
o endereços e saudades.

Adormecidos,
fabricamos versos.

Somos peixes e homens.

Pescamos os deuses,
cores e traços,
nas telas de linho.


Iluminam-se as nuvens,
os poetas dormem.
Tecem outonos,
cantam manhãs.

Fragmentos

Navego sonhos.
Vivo a languidez
dos olhos frios
e secos.


Brincam meus dedos.
Amo-te, afogo-me.

Choro.
Rios caldalosos
lavam as dores.

Tens amor, eu sei.
Por que te escondes
Quando luares
Descalçam os pés?

Beijar teus lábios,
quero.

Vivo delírios.
Mornas palavras
completam-se,
cheias de medo
e dúvidas.

Linhas nascem.
Ligam desejos
aos horizontes
onde dormem os poetas
e seus amores.


Leves, passam.
Tatuam imagens
na fina pele lisa.

Brincam meus dedos.
Desenham lagos,
aves e montanhas.

Voltamos ao mar.

sábado, 6 de março de 2010

Insano

Arde o amor.
Queima
vagarosamente
no peito
na alma.

Insano
cega
alucina
e teima.

Eterno
o desejo
é fogo
e fúria.

É rima
solta
colada
nas páginas
de um livro.

( Releitura do poema "Esse amor"
de ELIANE THOMAS

sexta-feira, 5 de março de 2010

Os fios da tarde,
Teciam as horas.

O cheiro das frutas
convidava-me para ceia.

Nas sombras, os dedos
contavam os anos.

Além do espelho,eu via fogueiras.
Corpo e alma buscavam
a lógica da existência.

Tudo vai, tudo flui -

Diziam duendes
atrás das árvores.

Há desconforto quando a fé
deságua em nada.

Homens constroem
a própria história,
guardam passados.

Eu guardo a eternidade
na voz das personagens,
nos livros sagrados?

Dúvidas revelam-se
entre luz e sombras.

Na transparência das mãos,
multiplicam-se flores,
desejos e pão.

Continuo a existir
e a querer a salvação
num olhar de Deus.

Memórias do Canavial

Memórias do Canavial ( Para Vinicius Paioli )

As facas amoladas
cortam os nós da cana.
Decepam, acertam as linhas
e os traços das almas
dentro das alvas.

Longe e perto,
ouvem o eco da morte.
Vestem destinos.
Cedo,
chegam ao inferno.

As chamas devoram a pele e o tempo.
Assistimo a um macabro cerimonial.

Na memória, asas brancas
encharcadas de chuva,
atolam-se na lama
e nas cinzas.

A facas cortam e apagam
as vozes cansadas
depois da ceia.

quarta-feira, 3 de março de 2010

O Sono de Deus

Pálidas são as cores
do quarto onde amanheço.

As velhas roupas,
esperam-me amanhã,
para o embarque.

Cedo, chego à estação.
As pessoas olham-me,
iluminadas pelos faróis
das locomotivas.

Sigo as trilhas do tempo.

Medos corroem as unhas,
quebram os dedos.

Loucas são tuas palavras
-dizem algumas almas.

Atrás das portas,
espelhos se quebram.

Passeio pela casa, paro,escrevo
e interrogo a mim mesmo.

Onde encontrar as respostas
para esse vazio infindo?

-Não sei, não sei, não sei.

Sobre nuvens,
Deus continua dormindo.

terça-feira, 2 de março de 2010

Barco de papel

Na areia do tempo
sou menino
brincando
ouvindo

bonecos
de barro
e pano.

Soltos,
os olhos
saltam.

No horizonte,
pipas levam em cores,
recados para Deus.


Visito mares e países
logo alí,
na primeira esquina,
além da rua onde moro.

Sou um menino no mundo.
Um Capitão Raimundo
num barco de papel.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Freudianas

Sensação de abandono.
Édipo mal abre os olhos
e apressa meus passos
para ouvir as súplicas,
neuroses de minha mãe.

Tenho esquizofrenia aguda.

Ouço nos cantos da sala,
a voz das almas perturbadas.
Nas paredes, versos de luz
cegam meus olhos.

Eros e Tanatos torcem meus braços,
erigem meus cabelos.
No criado-mudo, dedos deslizam,
barulham horas em agonia.

Onde encontrar remédios para salvar-me?

Amanhecer no Shopping Center
ou sair por aí, com a cara franciscana
cantando louvores às filhas de Maria?

No espelho do quarto, leio recados
escritos com letras vermelhas:

Perigosas são as palavras.

Vagarosa, passa a tarde.
Entre ruas e parques,
Meus olhos procuram no chão
o número da sala do terapeuta.

Um Grito

Nas águas onde lavo o rosto,
luas se mostram em cores.
Descansam meus olhos
molhados no azul.

Ouço mares e folhas.

Ouço versos estranhos
quando tropeço na relva
e nos galhos secos
impedindo passagens.

Confusas são as imagens
no espelho onde perdemos
a alma.

Fogem as palavras
embaralhadas no escuro
da boca
ao gritar no vazio.

Corpos se abraçam,
em silêncio, se amam.

Encontro-me nas fotografias
e no ar fresco das manhãs.

Eu amo e não derramo palavras.

Retrato de Quinta-Feira

Mudas palavras acordam a manhã
e se perdem na palidez dos meus lábios.

Secos, os cabelos se enroscam,
se quebram entre os dedos.

Trêmulas, as mãos se acalmam.
Nas cordas de um violão,
canções afugentam a angústia e o medo.

Lágrimas apagam a luz das paisagens
e o verde musgo das folhas
entre os muros da velha casa.

Cigarros acesos, apagam as estrelas
e as flores estampadas nas cortinas da sala.


Barulham talheres nas mesas.
No chão, jornais amassados.

Antigas parábolas colorem as páginas dos livros sagrados.


A quinta-feira chora uma tarde molhada.
Ouço os versos feitos de vento e nuvens.

Penso

nas flores e frutas.
e lembro-me das canções
para celebrar um dia.

Penso na carne dos bichos,
alimento dos homens.


A natureza veste
árvores e lírios.
Poetas desfiam
nuvens em cores.

Penso
nas cartas guardadas.
São castas palavras
soltas no tempo.

Penso
nos prazeres humanos.
São águas passadas
em ondas e ventos.

Qualquer

Qualquer coisa vira madrugada a dentro.
Qualquer copo serve o vinho.

Qualquer coisa paralisa às mãos trêmulas,
apaga a palidez da pele fria e úmida.

Qualquer coisa atrai os ventos,
sopra o verde das folhas
quando amanhece o outono.

Qualquer coisa faço e bebo.
Um misto de pó mágico
e água de chuva.

Qualquer coisa acorda o amor
que anda vazio e calado.

Qualquer luz ilumina cenários:
Meus personagens celebram
o beijo de Apolo e Baco.

Qualquer cena é sucesso
num baile de máscaras.

Sarau em comemoração ao 10 demorte da poeta Orides Fontela, em São João da Boa Vista-SP, dezembro de 2008.